Com a vontade nua de seguir, entrei meio a contragosto naquele carro. Afogueado, que estavas, não havia reparado em ti. A estrada foi me vencendo, minha irritação se diluía na neblina da alta noite. Olhei pra ti. Estava ali, calado, casmurro, cuidando distraidamente da sua existência, Existência essa que me pareceu por completo. A linha da sua cara de homem, a linha do seu queixo bem marcada, a expressão limpa, que corria por toda a extensão de braços e pernas que de forma atrevida existiam, e se faziam existir.
Sua boca te desmentia, não era terrena, existia nela uma mentira qualquer que despertava fascínio, e fazia assim com toda sua existência, plenitude.
Plenitude, era digno de minha inveja, Reunia em ti toda a existência do mundo e eras de forma doce preso as correntes da liberdade.
Quando ensaiou de abrir a boca, tive a impressão de que Zeus em pessoa estivesse do meu lado. Que exagerado sou. Com meia palavra balbuciada entre dentes, fez com que eu deseja-se que a estrada fosse interminável, cheguei a sonhar com a possibilidade de não ter fim. Tua existência era digna de ser aprendida. De ser copiada, Desesperado, notei com certa inquietação, que você pertencia a si e pronto. Tentar apreender seria suicídio. Não saberia me comprar da mesma forma que não sei me vender.
Nosso destino chegou, entristeci com a despedida mas, sei que fui mais forte que ti. Desci pleno da certeza de sua existência, e não olhei para trás nem em pensamento. você sumiu de mim quando virei a esquina, E por meio do meu ser voltei a viver. Já em casa, percebi que tua plenitude era também minha. Sim, minha.
Era também minha.
Vinha também do meu eu, que quando entrei naquele carro, estava cansado, cansado da luta. Precisava de liberdade. um ato que fosse. Ato esse que me fosse caro e que eu não precisa-se arcar. Afinal a vida é cara. Tomei de ti, toda a expressão da calma. Casmurro que o eras, estava na completude do seu ser, cheio de calma. Calma que era meu ato. Minha porta de fuga da luta. Aí eu entrei. Entrei e me deparei boquiaberto com toda sua existência, Que era também minha, e era minha por que nasceu da necessidade do meu verbo.
Cássio Leonardo